NO ANO 70 DA ERA COMUM 1, o Templo de Jerusalém foi
destruído, e mesmo sendo um mandamento perpétuo, o dízimo não poderia mais ser
praticado naquele lugar. Isso porque, todas as contribuições estavam de alguma
forma, relacionadas a ele. O Templo era onde estava o Nome de Deus e
também onde Sua Misericórdia deveria ser manifestada aos necessitados por meio
do dízimo. Os sacerdotes serviam no Templo; os levitas serviam no Templo; o Lugar
ou Casa do Tesouro era no Templo; a reunião familiar do “segundo dízimo”
acontecia nas dependências ou proximidades do Templo. A única celebração retribuitiva
que poderia continuar acontecendo era o Maasser Ani, o Dízimo do
Pobre, que independia da existência do Templo. Jesus em seu ensino de
misericórdia parece ter usado a celebração anual do Maasser Ani, em
combinação com outra celebração importante para os Judeus, criando uma
celebração híbrida. Ele fundiu a celebração de Páscoa com a celebração
do dízimo que deveria ser dado aos pobres – Maasser Ani – , tornando-a,
a celebração oficial da Igreja.
Foi na celebração da Páscoa, que Jesus determinou a seus alunos que se
reunissem com frequência para um banquete festejando a libertação que ele
promoveria daquele momento em diante. Esse banquete libertário também deveria
ser oferecido a todos que desejassem ser livres. Essa festa puramente judaica
foi incorporada à Igreja, não somente como a celebração da lembrança da
libertação dos filhos de Abraão do cativeiro, mas também a celebração da
libertação completa de quem acredita e aceita que Jesus é o seu Messias.
A “salvação” deve ser oferecida nos mesmos moldes do Dízimo do
Pobre a todos que participam desse encontro de Graça. Porém as certezas
doutrinárias e religiosas deturparam o verdadeiro sentido do banquete
libertário de Páscoa. A cerimônia conhecida como “Ceia do senhor”,
ganhou cores religiosas, sectárias e odientas. A “Ceia do Senhor”
realizada pelas religiões é caridosa, exclusivista, separatista; só participam
dela pessoas previamente escolhidas ou credenciadas ritualisticamente. Ela não
é mais para o ajuntamento, é somente para um grupo.
A celebração que Jesus quer que seja realizada, todas as vezes que nos
ajuntarmos em memória do sacrifício dele, deve celebrar nossa libertação – de
tudo e de todos –, nossa salvação, e o prazer de estarmos servindo como
libertadores e salvadores, dos que estão comendo e bebendo conosco em um
ajuntamento comungante. Esta é nossa celebração de dízimo: dividir o pão e o
vinho – e o que mais estiver sobre a mesa – com os necessitados de pão, vinho e
salvação. Este momento divino deve ser para nós ato sagrado onde chamamos ao
banquete de libertação, todos os que têm fome e sede de Justiça, para serem
fartos. Ali, as boas notícias de que nosso Messias pode salvar de uma
existência sem propósito e gerenciada pelo ego, devem ser ensinadas aos
necessitados para que eles também retribuam aos “outros” que encontrarem
pela vida, o que estão recebendo de nós. O banquete celebrando a comunhão, além
de nos fazer relembrar da salvação nos faz entender a verdade do dízimo.
Não sei se você consegue ver as cores vivas desta nova realidade sobre o
dízimo. Eu vejo, que a celebração da passagem2 de um estado
de necessitado para um estado de retribuidor é a afetivação 3
da salvação. Uma salvação que só se efetiva quando se torna integral.
Assusta-me saber que a única certeza material que possuo de minha salvação,
está na prática da salvação que digo ter, enquanto vivo minha própria salvação,
como vocifera o texto de Mateus 25 do verso 34 em diante. Infelizmente a
congregação virou instituição, da mesma forma que a religião se estatizou, e
quando essa mistura ocorreu, a igreja religiosa se tornou um agente coletor de
impostos, um cobrador de dízimos; deixou de ser um ente doador, um
misericordioso.
A salvação que Jesus traz, faz com que as pessoas entendam que precisam
realizar a conversão, precisam voltar a ser doadores, misericordiosos, precisam
voltar a ser justos. A conversão do levita Mateus de cobrador a doador mostra
exatamente isso. Aquele homem saiu de seu escritório de cobranças, de sua
coletoria e foi para casa oferecer um banquete em retribuição a liberdade
oferecida por Jesus. Zaqueu, outro cobrador de impostos também mudou
radicalmente seu comportamento se prontificando a retribuir quatro vezes mais
aos que antes foram cobrados por ele. Mateus e Zaqueu ofereceram um jantar aos
semelhantes – cobradores, pecadores e Jesus – celebrando a boa
notícia que estavam salvos, libertos de um estado desgraçado. A salvação se
efetiva na afetivação 4 de um cobrador. Porque nenhum
cobrador sabe dos sentimentos de um necessitado, a não ser que se torne necessitado.
A conversão se efetiva quando o cobrador é salvo pelo Messias do estado
miserável em que vive e passa a ser um misericordioso. Ser salvo por Jesus é salvar
aos “outros” de si, em Jesus.
***
Notas – Um banquete celebrando a liberdade de
retribuir.
1. Era Comum. Termo normalmente usado em lugar de “Depois de Cristo”.
2. Passagem – do hebraico: Peshach - Páscoa.
3. Neologismo do autor: Ação de afeição, ação do afeto.
4. Neologismo do autor: Ação de afeição, ação do afeto.
Abreviações
BACF - Bíblia Almeida Corrigida e Fiel; BJC - Bíblia
Judaica Completa; BH - Bíblia Hebraica; BNVI - Bíblia Nova Versão
Internacional; ES - Escrituras Sagradas; BEP - Bíblia Edição
Pastoral.
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