"Sempre fomos livres nas profundezas de nosso coração, totalmente livres, homens e mulheres.
Fomos escravos no mundo externo, mas homens e mulheres livres em nossa alma e espírito."
Maharal de Praga (1525-1609)

Um banquete celebrando
a liberdade de retribuir.


NO ANO 70 DA ERA COMUM 1, o Templo de Jerusalém foi destruído, e mesmo sendo um mandamento perpétuo, o dízimo não poderia mais ser praticado naquele lugar. Isso porque, todas as contribuições estavam de alguma forma, relacionadas a ele. O Templo era onde estava o Nome de Deus e também onde Sua Misericórdia deveria ser manifestada aos necessitados por meio do dízimo. Os sacerdotes serviam no Templo; os levitas serviam no Templo; o Lugar ou Casa do Tesouro era no Templo; a reunião familiar do “segundo dízimo” acontecia nas dependências ou proximidades do Templo. A única celebração retribuitiva que poderia continuar acontecendo era o Maasser Ani, o Dízimo do Pobre, que independia da existência do Templo. Jesus em seu ensino de misericórdia parece ter usado a celebração anual do Maasser Ani, em combinação com outra celebração importante para os Judeus, criando uma celebração híbrida. Ele fundiu a celebração de Páscoa com a celebração do dízimo que deveria ser dado aos pobres – Maasser Ani – , tornando-a, a celebração oficial da Igreja.

Foi na celebração da Páscoa, que Jesus determinou a seus alunos que se reunissem com frequência para um banquete festejando a libertação que ele promoveria daquele momento em diante. Esse banquete libertário também deveria ser oferecido a todos que desejassem ser livres. Essa festa puramente judaica foi incorporada à Igreja, não somente como a celebração da lembrança da libertação dos filhos de Abraão do cativeiro, mas também a celebração da libertação completa de quem acredita e aceita que Jesus é o seu Messias.

A “salvação” deve ser oferecida nos mesmos moldes do Dízimo do Pobre a todos que participam desse encontro de Graça. Porém as certezas doutrinárias e religiosas deturparam o verdadeiro sentido do banquete libertário de Páscoa. A cerimônia conhecida como “Ceia do senhor”, ganhou cores religiosas, sectárias e odientas. A “Ceia do Senhor” realizada pelas religiões é caridosa, exclusivista, separatista; só participam dela pessoas previamente escolhidas ou credenciadas ritualisticamente. Ela não é mais para o ajuntamento, é somente para um grupo.

A celebração que Jesus quer que seja realizada, todas as vezes que nos ajuntarmos em memória do sacrifício dele, deve celebrar nossa libertação – de tudo e de todos –, nossa salvação, e o prazer de estarmos servindo como libertadores e salvadores, dos que estão comendo e bebendo conosco em um ajuntamento comungante. Esta é nossa celebração de dízimo: dividir o pão e o vinho – e o que mais estiver sobre a mesa – com os necessitados de pão, vinho e salvação. Este momento divino deve ser para nós ato sagrado onde chamamos ao banquete de libertação, todos os que têm fome e sede de Justiça, para serem fartos. Ali, as boas notícias de que nosso Messias pode salvar de uma existência sem propósito e gerenciada pelo ego, devem ser ensinadas aos necessitados para que eles também retribuam aos “outros” que encontrarem pela vida, o que estão recebendo de nós. O banquete celebrando a comunhão, além de nos fazer relembrar da salvação nos faz entender a verdade do dízimo.

Não sei se você consegue ver as cores vivas desta nova realidade sobre o dízimo. Eu vejo, que a celebração da passagem2 de um estado de necessitado para um estado de retribuidor é a afetivação 3 da salvação. Uma salvação que só se efetiva quando se torna integral. Assusta-me saber que a única certeza material que possuo de minha salvação, está na prática da salvação que digo ter, enquanto vivo minha própria salvação, como vocifera o texto de Mateus 25 do verso 34 em diante. Infelizmente a congregação virou instituição, da mesma forma que a religião se estatizou, e quando essa mistura ocorreu, a igreja religiosa se tornou um agente coletor de impostos, um cobrador de dízimos; deixou de ser um ente doador, um misericordioso.

A salvação que Jesus traz, faz com que as pessoas entendam que precisam realizar a conversão, precisam voltar a ser doadores, misericordiosos, precisam voltar a ser justos. A conversão do levita Mateus de cobrador a doador mostra exatamente isso. Aquele homem saiu de seu escritório de cobranças, de sua coletoria e foi para casa oferecer um banquete em retribuição a liberdade oferecida por Jesus. Zaqueu, outro cobrador de impostos também mudou radicalmente seu comportamento se prontificando a retribuir quatro vezes mais aos que antes foram cobrados por ele. Mateus e Zaqueu ofereceram um jantar aos semelhantes – cobradores, pecadores e Jesus – celebrando a boa notícia que estavam salvos, libertos de um estado desgraçado. A salvação se efetiva na afetivação 4 de um cobrador. Porque nenhum cobrador sabe dos sentimentos de um necessitado, a não ser que se torne necessitado. A conversão se efetiva quando o cobrador é salvo pelo Messias do estado miserável em que vive e passa a ser um misericordioso. Ser salvo por Jesus é salvar aos “outros” de si, em Jesus.



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Notas – Um banquete celebrando a liberdade de retribuir.
1. Era Comum. Termo normalmente usado em lugar de “Depois de Cristo”.
2. Passagem – do hebraico: Peshach - Páscoa.
3. Neologismo do autor: Ação de afeição, ação do afeto.
4. Neologismo do autor: Ação de afeição, ação do afeto.

Abreviações
BACF - Bíblia Almeida Corrigida e Fiel; BJC - Bíblia Judaica Completa; BH - Bíblia Hebraica; BNVI - Bíblia Nova Versão Internacional; ES - Escrituras Sagradas; BEP - Bíblia Edição Pastoral.


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